sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Dead woman walking


Não existe lugar pior no mundo do que rodoviária. É onde circulam milhares de pessoas, mas a solidão é reinante. Alguns chegando, outros partindo, cada um com os seus problemas.

Eu detesto.

Como geralmente estou ali contra a minha vontade, a minha cara nunca é das mais amistosas. E obviamente isto não impede que puxem assunto comigo - ou atrai, sei lá. Amigo, desculpe, mas me deixe só com a minha derrota, porque esta sim, nunca me abandona.
Quando eu tô chegando, tudo é lindo. A fila no guichê do Bilhete Único, o mau humor no stand de créditos para celular, o povo que nunca viu escada rolante na vida, tudo. Voltando não, voltando é derrota, é cara na lona, sem revanche e sem contagem de pontos.

Eu chego rezando pra não ter que voltar, mas até agora não ouviram as minhas preces.

Nas horas que sigo sentada, esperando Godot, esperando a forca sobre rodas, tento, desesperada, uma última oração, soada de gongo, algo que me impeça de ir, que me livre da queda do banquinho ou da abertura do alçapão sob meus pés. Um maldito Zorro que fosse.

Nunca acontece.

Aí a reza muda para "que pelo menos o ônibus vá vazio", porque ainda pior do que a forca, é quando junto dela tem uma plateia animada.
Às vezes algum anjo estagiário fica com dó da minha oratória descontrol e atende este último suspiro.
Enquanto escrevo, sentada num pedaço de concreto - os bancos estão lotados - estou na fé daquelas que dizem remover montanhas para que eu siga o meu caminho Dutra a fora, sozinha na poltrona.

Ainda seguirão 6 horas da mais pura gastura, naquele dorme-não-dorme, a poltrona que não reclina direito, o pescoço que dói, o saculejo sem fim, o forró eletrônico interminável no radinho-celular sem fone de ouvido de algum perdido indo farrear no RJ. Do alto de sua soberania de algoz, o motorista me concede 30 minutos de respiro, numa parada nnum Graal, no meio do caminho. Quanta generosidade, moço, Deus lhe pague...em estriquinina.

Olho o relógio, cavuco o celular na bolsa. Nenhuma mensagem, nem de adeus, nem de volte logo, nem de promoção da TIM, esses cornos que sempre me mandam SMS de madrugada. Abandono full throttle.

Mais 3 horas pelas frente, nada pra se ouvir, a não ser o forró eletrônico maldito do sem-mãe sentado lá na frente, e as coisas que eu gostaria de ouvir, que ficam em repeat loop na cabeça, enquanto tento destravar a coluna e dormir.

Vejo, a 300 metros, a fachada da rodoviária Novo Rio, que de novo não tem nada, e olho mais uma vez o celular. A única mudança é, no visor, o TIM SP agora é TIM RJ.

Fim de luta. Soa o gongo. Perdi.

E como pra quem tá cagado um peido não faz medo, pego um táxi. Isso, um táxi, na porta da rodoviária no Rio. A derrota deixa a gente besta e destemido.

Nem cinturão de ouro, nem coroa de louros. Só Tony Bennett sabe o que se passa, ambos deixamos nossos corações em outras cidades. Então, bora viver roboticamente até voltarmos lá para buscá-los.